quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

O hermafrodita

------
------
------
EPITAPHIUM CATHARINÆ PUELLÆ ORNATISSIMÆ

Hoc jacet ingenuæ formæ Catharina sepulcro;
Grata fuit multis scita puella procis.
Morte sua lugent cantus lugentque choreæ,
Flet Venus, et mœsto corpore mœret Amor.



EPITÁFIO DE CATARINA, MENINA ELEGANTÍSSIMA

Aqui jaz Catarina, de belas formas. A graciosa menina foi querida a muitos amantes. Com a sua morte, estão de luto os cantos e as danças; Vénus chora e, com o corpo dolente, chora o Amor.



LAUS AURISPÆ AD COSMUM

Si quis erit priscis æquandus, Cosme, poetis,
Et si cui Phœbus Pieridesque favent,
Si quis cum loquitur vel splendida facta reponit,
Mercurium jures ejus ab ore loqui,
Quive alios laudet, cum sit laudabilis ipse,
Quive hedera merito tempora nexa ferat,
Si quis erit linguæ doctus Grajæ atque Latinæ,
Si non Aurispa est hic, periisse velim.
Quisquis in hoc mecum non senserit, arbiter æquus
Non fuit, aut certe Zoilus ille fuit.


ELOGIO DE AURISPA, A CÓSIMO

Se há quem merece, ó Cósimo, ser comparado aos poetas antigos, se há alguém que Febo e as Piérides favorecem, se há quem conta e canta feitos grandiosos, de tal modo que tu jurarias que Mercúrio fala pela sua boca, que louva os outros, ele que merece todos os louvores, e que tem as suas têmporas cingidas de hera por direito próprio; se ele é douto nas línguas Grega e Latina, se essa pessoa não é Aurispa, eu que morra!
Quem não pensar como eu, não pode ser justo juiz, ou então será com certeza Zoilo.


De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano

sábado, 4 de dezembro de 2010

O hermafrodita

------
------
------
Ad Ursam flentem

Quid fles? en nitidos turbat tibi fletus ocellos!
Quid fles, o lacrymis Ursa decora tuis?
Forte quod adversus te acciverit ira Camenas,
Aut mihi quod tu sis non adamata putes?
Crede mihi, mea lux, tantum te diligo, quantum
Non magis ex animo quisquis amare queat.
Tu quoque me redamas. Dubium est, qui vincit amore,
Alter utram vincit, vincitur alter utra.
Cur igitur credis vitio qui ductus iniquo
Inter nos rixam dissidiumque cupit?
Juro per has lacrimas et crura simillima lacti,
Perque nates molles, et femur, Ursa, tuum,
Quod nunquam nisi quæ te laudent carmina feci;
Sic sit versiculis gratia multa meis.
Ah pereat quæso tibi qui mendacia dixit!
Ah pereat falsum qui tibi cumque refert!
Terge tuos fletus, sine te dissuavier, Ursa:
Farce mihi, luctu torqueor ipse tuo.
Tandem siste tui lacrymas, curaque salutem,
Namque ego te domina sospite sospes ero.


A Ursa, que chora

Por que choras? O pranto ofusca os teus olhos brilhantes! Por que choras, ó Ursa? Ficas mais bonita com as tuas lágrimas? Talvez porque a raiva excitou contra ti a minha musa, ou porque pensas que já não és por mim amada? Acredita, minha querida, eu amo-te tanto como mais ninguém pode amar do fundo da alma. E tu também me amas. Não se sabe quem de nós dois ama mais; um ama o outro e é amado com um amor igual. Então porque crês em quem, por um instinto iníquo, fomenta entre nós dissensão e discórdia?
Juro-te pelas tuas lágrimas, pelas tuas coxas mais brancas que o leite, pelas tuas nádegas macias, pela tua crica, ó Ursa, que nunca escrevi versos senão em teu louvor, e é por ti que os meus versos têm beleza. Morra quem te disse essas falsas coisas! Morra quem te disse essa mentira! Enxuga as tuas lágrimas; deixa que te beije. Ursa, tem piedade de mim, a tua tristeza é para
mim tortura. Trava as tuas lágrimas, pensa na tua saúde: porque eu estarei bem se a minha senhora estiver bem.


De pœna infernali, quam dat Ursa auctori
superstiti

Si calor et fœtor, strider quoque sontibus umbris
Sint apud infernos ultima pœna locos,
Ipse ego Tartareas, dum vivo, perfero pœnas,
Id mihi supplicium suggerit Ursa triplex.
Nam sibi merdivomum stridit resonatque foramen,
Fervet et Ursa femur, putet et Ursa pedes..


Do suplício infernal que Ursa inflige ao autor sobrevivente

Se o calor, o fedor, o chinfrim atormentam as almas condenadas no inferno, último suplício delas, eu, vivo ainda, sofro as penas de Tártaro. Ursa inflige-me um tríplice suplício, pois o seu ânus assobia e troveja, as suas coxas queimam, cheiram mal os seus pés.


De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O hermafrodita

------
------
------
AD MATRONAS ET VIRGINES CASTAS

Quæque ades, exhortor, procul hinc, Matrona, recede:
Quæque ades, hinc pariter, virgo pudica, fuge.
Exuor, en bracis jam prosilit inguen apertis,
Et mea permulto Musa sepulta mero est.
Stet, legat et laudet versus Nichina procaces,
Adsueta et nudos Ursa videre viros.


ÀS MATRONAS E ÀS VIRGENS CASTAS

Sejas tu quem fores, Matrona, vai para bem longe; e tu também, pudica Virgem, foge. Dispo-me, da braguilha aberta sai o meu pénis; a minha Musa está desfeita pelo excesso de bebida. Quinina pode ficar, ela que leia e gabe os versos lascivos; Ursa também, habituada como ela a ver homens nus.



EPITAPHIUM NICHINÆ FLANDRENSIS, SCORTI EGREGII

Si steteris paulum, versus et legeris istos,
Hac gnosces meretrix quæ tumulatur humo.
Rapta fui e patria teneris pulchella sub annis,
Mota proci lacrymis, mota proci precibus.
Flandria me genuit, totum peragravimus orbem,
Tandem me placidæ continuere Senæ.
Nomen erat, nomen notum, Nichina; lupanar
Incolui, fulgor fornicis unus eram.
Pulcra decensque fui, redolens et mundior auro,
Membra fuere mihi candidiora nive.
Quæ melior nec erat Senensi in fornice Thais
Gnorit vibratas ulla movere nates.
Rapta viris tremula fìgebam basia lingua.
Post etiam coitus oscula multa dabam.
Lectus erat multo et niveo centone refertus,
Tergebat nervos officiosa manus.
Pelvis erat cellæ in medio, qua sæpe lavabar,
Lambebat badidum blanda Catella femur.
Nox erat, et juvenum me sollicitante caterva
Substinui centum non satiata vices.
Dulcis, amœna fui, multis mea facta placebant,
Sed præter pretium nil mihi dulce fuit.


EPITÁFIO A NIQUINA DE FLANDRES, CORTESÃ FAMOSA

Se parares um instante e leres estes versos, saberás quem é a cortesã que aqui debaixo está enterrada. Na tenra idade, deixei a minha Pátria, levada pelas lágrimas do amante, arrastada pelas suas preces. Nasci na Flandres, peregrinei por todo o mundo, por fim descansei na tranquila Siena. O meu nome era Niquina, nome famoso; estive em lupanares, fui o esplendor dos bordéis. Fui bela e agradável, perfumada e mais limpa que o ouro, com os membros mais brancos que a neve. No bordel de Siena, nenhuma Thaïs mexia melhor as nádegas do que eu. Com a língua vibrante dava beijos inflamados aos homens e até após o sexo, dava muitos beijos. O meu leito estava cheio de níveos tecidos, e a minha mão industriosa acalmava os nervos. Havia no quarto uma bacia em que frequentemente me lavava, uma cadelita mansa lambia a minha coxa húmida. Uma noite, tendo-mo pedido um grupo de jovens, aguentei uma centena de assaltos, sem ficar saciada. Fui doce e agradável, a muitos agradava a minha maneira de ser, mas a mim, nada me dava prazer, se não o dinheiro.



OPTAT PRO NICHINA DEFUNCTA

Oro tuum violas spiret, Nichina, sepulcrum,
Sitque tuo cineri non onerosa silex.
Pieriæ cantent circum tua busta puellæ.
Et Phœbus lyricis mulceat ossa sonis.


FAZ VOTOS PELA FALECIDA NIQUINA

Desejo, ó Niquina, que o teu sepulcro tenha o odor de violetas. E que sobre os teus restos não esteja uma pesada pedra. Que as jovens Piérides cantem em redor da tua tumba. E que Febo com os seus líricos cânticos acaricie os teus ossos.


De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano

sábado, 6 de novembro de 2010

O hermafrodita

------
------
------

AD AURISPAM DE URSÆ VULVA

Ecquis erit, vir gnare, modus, ne vulva voracis
Ursa testiculos sorbeat usque meos
Ecquis erit, lotum femur hæc ne sugat hirudo,
Ne prorsus ventrem sugat ad usque meum?
Aut illam stringas quavis, Aurispa, medela,
Aut equidem cunno naufragor ipse suo.


A AURISPA, SOBRE A CRICA DE URSA

Haverá algum modo, homem sábio, para que a vulva voraz de Ursa não engula os meus testículos? Um meio para que esta sanguessuga não sugue toda a minha coxa, e em seguida me sugue também o meu ventre? Não importa como, Aurispa, encolhe-a, ou certamente irei naufragar na sua crica.




AURISPÆ RESPONSIO

Si semper tantus spirare in æquore fœtor,
Neminis ut nasus littora ferre queat,
Quis vel in Adriaco, Scythico quis navita posset,
Aut in Tyrrheno naufragus esse mari?
Et tu ne timeas; nam cum magis arrigie Ursæ,
Cumve magis cupias, vulva repellet olens.
Hæc fiat ita horrendum, quod pingue et putre cadaver
Ursæ cum cunno lilia pulcra foret.
Hæc flat ita, ut, merdis si quisquam conferat inguen,
Sit violæ et suaves multa cloaca rosæ.
Sin tuus hunc talem non horret nasus odorem,
Ut sit tunc vulva strictior Ursa dabo.



RESPOSTA DE AURISPA

Se sempre exala das ondas um fedor tal que nenhum nariz pode tolerar o mar, qual o barqueiro que irá naufragar no mar Adriático, no Cítico ou no Tirreno? E tu não temas, pois, quanto mais anseias por Ursa, quanto mais a desejas, mais a sua natureza pútrida te repele. Ela emana um odor tão nauseabundo que um cadáver gordo e já podre, em comparação com a vulva de Ursa, é um lírio perfumado. Ela emana um fedor tal, que comparada aos excrementos, a cloaca transforma-se em violetas e rosas suaves. Se o teu nariz não rejeita um tal odor, procurarei então tornar mais estreita a crica de Ursa.


De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

O hermafrodita

------
------
------
DE URSA SUPERINCUBANTE

Quum mea vult futui superincubat Ursa priapo;
Ipse suas partes subtineo, illa meas.
Si juvat, Ursa, vehi, moveas clunemque femurque
Parcius, aut inguen non tolerabit onus.
Deinde cave reduci repetas ne podice penem:
Quamvis, Ursa, velis, non mea virga volet.



Sobre Ursa montada a cavalo

Quando a minha Ursa quer divertir-se, monta-se em mim: ela faz o meu papel e eu o dela. Por favor, Ursa, agita o traseiro e as coxas com jeitinho, senão o meu membro dobra-se com o peso. Depois, não puxes de novo a verga para a tua gruta: mesmo que tu, Ursa, o quisesses, ela não o quereria.


De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano

domingo, 24 de outubro de 2010

O hermafrodita

------
------
------
LAUS ALDÆ

Si tibi sint pharetræ atque arcus, eris, Alda, Diana;
Si tibi sit manibus fax, eris, Alda, Venus.
Sume lyram et plectrum, fies quasi verus Apollo;
Si tibi sit cornu et thyrsus, Iacchus eris.
Si desint hæc, et mea sit tibi mentula cunno,
Pulcrior, Alda, Deis atque Deabus eris.


ELOGIO DE ALDA

Se tens o arco e as flechas, Alda, tu és Diana. Se tens na mão o archote, Alda, tu és Vénus. Pega na lira e no arco, serás quase um verdadeiro Apolo; com o corno e o Tirso, tu serás Jaco. Se te falta tudo isso, e o meu coiso está na tua crica, tu, Alda, serás mais bela que todos os deuses e deusas.



IN ALDÆ MATREM

Ut mihi tu claudis, mater stomachosa, fenestram,
Sic tibi claudatur cunnus, iniqua parens!
Id tibi erit gravius, cælebs videare licebit,
Quam tibi si cœli janua clausa foret.


CONTRA A MÃE DE ALDA

Do mesmo modo que tu me fechas a janela, mãe atrabiliária, a ti se te feche a crica, iníqua progenitora. Embora sejas celibatária, custar-te-á isso mais do que se se fechasse para ti a porta do céu.



De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano


sexta-feira, 22 de outubro de 2010

O hermafrodita

------
------
------
LAUS ALDÆ

Alda, puellarum fortunatissima, gaude:
Vincitur omnipotens igne Cupido tuo.
Alda Deos omnes specieque et moribus æquat;
Sit minime mirum, si capit Alda Deos.


ELOGIO DE ALDA

Alda, a mais bela das meninas, alegra-te, o omnipotente Cupido está vencido pela tua chama. Alda, pela sua beleza e costumes, iguala todos os deuses: não é espanto nenhum que Alda seduza os deuses.




DE VILLICO STULTO, ALDAM BASIANTE

Porticus ingentem facie dum sustinet Aldam,
Villicus incautæ basia rapta dedit.
Hunc vulgus stolidum credit, sed stultius illo est
Vulgus. Me miserum, quam bene, stulte, sapis!
Quum liceat stultis impune suavia nymphæ
Figere, Dii facerent, stultus ut ipse forem.


SOBRE UM VILÃO ESTULTO QUE BEIJAVA ALDA

Enquanto um carregador levanta Alda, de largo rosto, um vilão, sem ela dar conta, deu-lhe um beijo às escondidas. O povo julga-o maluco, mas bem mais maluco é o povo. Pobre de mim, como és esperto, ó estulto! Pois se aos doidos é permitido beijar impunemente as ninfas, fazei, deuses, que eu seja como aquele estulto!



LAUS ALDÆ

Aldæ oculi legere domum Charitesque Venusque,
Ridet et in labiis ipse Cupido suis.
Non mingit, verum si mingit balsama mingit;
Non cacat, aut violas, si cacat, Alda cacat.


EM LOUVOR DE ALDA

As Graças e Vénus escolheram para morada os olhos de Alda, nos seus lábios ri Cupido em pessoa. Ela não mija, ou, se mija, ela mija perfume; ela não defeca ou, se defeca, ela defeca violetas
.


De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O hermafrodita

------
----
-

DE CORVINO, VINUM ACCURATE CUSTODIENTE, NON UXOREM

Corvinus vegetem custodii clave seraque,
Non cohibet cunnum conjugis illa sera.
Zelotypus vegetis, cunni sed prodigus ille est;
Haustu nam cunnus non perit, illa perit.

De:
Hermaphroditus, de Antonio Beccadelli (Palermo, 1394 – Nápoles, 1471), dito o Panormita, isto é, Palermitano


Sobre Corvino, que vigia com cuidado o seu vinho mas não sua mulher

Corvino fecha à chave e com fechadura a sua pipa, mas não põe fechadura no jardim de sua mulher. É forreta com o vinho, mas pródigo com a crica: é que a crica não se gasta pelo uso, mas a pipa fica vazia.

domingo, 26 de setembro de 2010

Le diable au corps, de Raymond Radiguet

------
------
------
Aqui está um livro impressionante, não apenas por estar muito bem escrito, mas sobretudo por ter sido seu autor um rapaz de 17 anos, o francês Raymond Radiguet (1903 – 1923). Aos 15 anos foi para Paris, querendo seguir a profissão do pai – jornalista. Tornou-se amigo de Jean Cocteau que, provavelmente, lhe deu algumas sugestões para o livro.

Publicou o livro aos 20 anos e nesse mesmo ano, morreu de febre tifóide.
O livro teve um enorme sucesso até hoje. Em Portugal, saiu mais uma
recente edição.
Se quiser fugir à ganância dos editores portugueses, pode ler ou ouvir o livro no original francês num destes sites:

----------Texto:

----------O ----O---- O---- O---- O---- O

----------Texto e áudio:

----------O


Já foi adaptado para cinema por quatro vezes:


1947, Le diable au corps, dir. por Claude Autant-Lara, com Gérard Philipe, Micheline Presle, Denise Grey;

1986, Diavolo in corpo, dir. por Marco Bellocchio, com Maruschka Detmers, Federico Pitzalis, Anita Laurenzi;

1989, Beyond Innocence, dir. por Scott Murray, com Katia Caballero, Keith Smith

1990 (TV), Le diable au corps, dir. por Gérard Vergez, com Corinne Dacla, Jean-Michel Portal

R. Radiguet publicou também poesia. Pode ler o livrinho Les joues en feu aqui.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

A MARTINHADA / 2.º Canto

/
/
/
/
A MARTINHADA

CANTO SEGUNDO.

ARGUMENTO

O Martinho refere a parvoíce
Com que nascido foi, e mais gerado;
E que ainda na tenra meninice
Sempre andava c’o membro alevantado;
Que conservar querendo até à velhice
A potência viril no mesmo estado,
D’engonces um pismão para as mulheres
Lhe deu a feiticeira Aldonça Peres.

I.
O resplendor, que é astro, e que é deidade,
Para o Ocaso inclinava o vôo ardente,
Tendo menos da esplêndida metade
Da via d’ouro a esfera reluzente
Mas de cristal na límpida vaidade
Cansado busca a urna transparente;
Pagando a luz à neve em seus desmaios
As lágrimas que Aurora enxuga em raios.

II.
Finalmente na tarde o sol entrava,
Sem dar penso aos cavalos da carroça:
O lacaio depressa a sege lava;
Suada a regateira as v’rilhas coça;
O rústico hortelão na terra cava;
Da sesta sonolenta s’ergue a moça;
O badalo dos frades sem demoras
A vésperas tangia; eram três horas.

III.
Levados sempre à sirga em giros vários,
Com pacientes, mas antigas fleimas,
Já andavam mofinos caudatários
Levantando o docel das almorreimas:
Das ilustres culatras salafrários,
Exploravam n’olfacto, sem ter reimas;
Qu’é privilégio d’um prelado inteiro
Do cu não só ter olho, mas olheiro.

IV.
Neste tempo o Martinho diz: D’espanto
Da minha história é força que me ocorra :
E arrumando da casa para um canto
Da porra denegrida a trave burra,
Torna a dizer: Vocês ouçam-me, em quanto
Aos vasos este membro não dá surra;
Pois parece, no impulso da pancada,
De macho coice, ou de boi marrada.

V.
Viram meus Pais dois cães encangalhados,
E ouviram de dois burros a harmonia;
E destas cousas ambos esquentados,
Foram fazer em mim a mesma cria:
Sendo burros e cães os invocados,
S’ignorara a qual deles pertencia;
Mas tenho, por que iguais em tudo os ponha,
D’uns o juízo, d’outros a vergonha.

VI.
Pejada minha mãe teve acidentes,
De coices na barriga mataduras;
Qu’assim como os heróis nascem com dentes,
Eu no ventre já tinha ferraduras:
Sentia dentro em si vários crescentes,
Levedados da porra nas quenturas;
Dizendo, quando olhava para a pança
Deve de ter marés esta criança.

VII.
Vaticínios, prognósticos, e ensaios
Predisseram cruéis meu nascimento:
A uma moça da casa dois lacaios,
Pregaram um famoso esquentamento;
Dois machos de liteira, de cor baios,
A uma padeira vendo num jumento,
Enchem de molho, e fica (caso estranho )
Neles a febre, e na saloia o banho.

VIII.
Da Rua suja se viam n’atmosfera
Dois membros genitais resplandecentes,
Cometas, que do gálico na esfera
São da porra fenómenos ardentes.
Dizem as putas, que dos olhos era
Engano ver piçalhos reluzentes;
E que havia nos bélicos ensaios
Porras de pregos sim , mas não de raios.

IX.
Eis senão quando minha mãe com dores
Desmaiada mostrou algum perigo:
Assustou-se meu pai, sendo os temores
Faltar-lhe para o membro algum jazigo;
Apalpou a comadre com suores,
E um cirurgião de casa muito antigo
O escondido lugar, e os matos quedos,
Que de Fuente-rabia distam dos dedos.

X.
Mas o membro que estava reprimido,
Saindo afocinhou desesperado;
Da víbora ao veneno parecido,
Que o claustro maternal rompe assanhado.
A comadre, pasmando ao sucedido,
Proferiu neste ponto desgraçado:
Causou da natureza o desvario
Ao ventre humano um parto de safio!

XI.
Porém torna a dizer : É parto torto;
Nascerá a criança com defeito.
Mas disse o cirurgião, que estava absorto:
Arre-lá! Você qué-lo mais direito?
E a meu pai, que pergunta quase morto,
D’algum sucesso triste no conceito:
Temos caso infeliz? temos trabalho?
Responde: Não Senhor; temos cartilha.

XII.
Chegou-se então meu pai um pouco aflito;
E vendo desta porra o grande apresto,
Lhe diz, todo pasmado do conflito :
Eu não chamo isto parto, mas incesto;
E contra a natureza hoje o delito
Duas vezes envido ao vaso honesto;
Qu’esta porra infiel, como traidora
Fornica a mãe de dentro para fora.

XIII.
O cirurgião responde: Não s’enfade;
Que um filho sempre é báculo à velhice,
Arrimo d’uma casa na verdade,
Que, quando a põe segura, a faz felice:
Bem sei que desta parra a quantidade
Da criança arredada é parvoíce;
Porém nela achará, segundo eu creio,
Vossa mercê bordão, a casa esteio.

XIV.
E diz, voltando a minha mãe: Senhora,
Ponha-se em pé, e tenha confiança;
Que do seu parto o tudo está de fora,
Só falta o pouco resto da criança:
E assim foi; porque chegando a hora,
Tanto que de s’erguer teve a lembrança,
Pegado ao pé daquele tronco aceso
Me trouxe atrás de si da porra o peso.

XV.
Do gordo Carnaval na terça-feira
Veio ao mundo de carne esta bisarma,
Nos assaltos d’amor peça roqueira,
Do sexto mandamento infernal arma:
Cuidando minha mãe que era tocheira,
Do chão vendo a comadre levantar-ma,
Diz: Qu’é isto? da sorte foi descuido
Nascer da Páscoa o círio pelo Entrudo.

XVI.
Eu, e cada colhão d’igual tamanho
Somos partes que o membro em si coaduna.
Mas disse uma criada: É caso estranho
Que parisse noss’ ama uma coluna.
Responde outra: Às alvíssaras te apanho,
Porque eu vi de mais perto esta fortuna:
Pariu e tu não sabes o que dizes,
Um pinheiro que trouxe três raízes.

XVII.
O cirurgião profere em breve instante,
Com acentos bom pouco meditados;
A porra posta em pé como um gigante,
A criança e colhões no chão deitados!
No mundo não há caso semelhante,
No século presente, e nos passados;
Mas ai! é Gerião posto às avessas,
Que para baixo tem as três cabeças.

XVIII.
Depois de tudo isto vindo a ama,
Toda dengue embrulhada num capote,
Disse: Não há d’entrar na minha cama
A criança pegada a um barrote.
Mas disse uma criada : S’em Alfama
Marujo houver, que o tenha d’este lote,
Voto de baixo dele em romaria
Varrer co’as ancas toda a Trafaria,

XIX.
Contudo, que eu mamasse quis piedosa
Porém o membralhão tirava o jeito;
Até que achando o modo, cuidadosa
No membro se assentou, e deu-me o peito;
Ele sentiu que a carga era gostosa,
Começando a bulir-se mais direito,
Nas mamas, e na porra, co’a quentura
Tinha eu, e a ama, igual apojadura.

XX:
O membro, que se adiava em represália,
O gargalo estendendo do pescoço,
Mais d’um alqueire de fideus d’Italia
Desfeitos lhe repôs em caldo grosso:
Zaragatoa, cola, pez, e algalia
(Diz a ama) bota o membro do caroço;
Ou é âmbar, que agora regurgita;
Pois parece baleia que vomita.

XXI.
Toda a gente de casa vem chegando;
Mas imóvel ficou um pouco, vendo
Sem idade o marzapo venerando,
Qu’está dotado d’um tesão tremendo.
Mas dizem os mais velhos acenando:
Esta porra é prognóstico estupendo;
Vem primeiro em preságio, e depois disto
Há-de soldar-se ao corpo do Anti-Cristo.

-----------------------F I M

A MARTINHADA / 1.º Canto

/
/
/
/

//////Caetano José da Silva Souto Maior nasceu em Olivença (então ainda Portugal) em 1694, filho de Gaspar da Silva Moniz, Provedor do Reino e de Isabel Teresa Souto Maior, Dama da Rainha D. Maria Ana de Áustria, esposa de D. João V. Faleceu em 18 de Agosto de 1739. Formou-se em Coimbra em Cânones e desempenhou as funções de Juiz dos Órfãos de Lisboa, Juiz do Crime do Bairro da Mouraria e, desde 1737, Corregedor do Bairro do Rossio. Ficou conhecido como o “Camões do Rossio”, referência à facilidade com que versejava. Tinha a confiança do Rei D. João V, que achava piada aos seus chistes.
//////O poema “A Martinhada” é dedicado a Frei Martinho de Barros, que era confessor do Rei. Conta-nos José Maria da Costa e Silva: “Dizem que o Frei Martinho, herói desta composição, era nada menos do que o próprio confessor d’El-Rei D. João V, e que o poeta quisera desafogar o ódio que lhe tinha, expondo a ridículo a lubricidade de sátiro do masmarro, que se queixou altamente, e lera, pedindo vingança, parte do poema ao seu real penitente, que desatou a rir”.
//////“A Martinhada” circulou em manuscrito durante todo o século XVIII e só foi impressa em Londres em 1814. Já no Sec. XIX, sucederam-se as edições, muitas vezes juntamente com outros poemas do mesmo género.



A MARTINHADA

CANTO PRIMEIRO.

ARGUMENTO

Propõe-se a todos a estação calmosa,
E o reverendo mango dos mangazes,
Que com bruto furor, ânsia pasmosa
Vai fodendo mulheres e rapazes:
O comprimento da extensão nervosa,
Que acompanhando a dois colhões lambazes,
Descobriu novamente disconforme
Rara fodenga em máquina triforme.



I.
Eu canto a Porra, e o Varão potente,
Esse que fez dos rins no seminário
A toda a carne humana, guerra ardente,
No excesso do apetite fornicário;
O Martinho, ou carneiro de semente,
Que sobre as putas tem membro arbitrário;
Eclesiástico anfíbio de maldade,
Que juntamente foi clérigo e frade.

II.
Este é o varão; o membro é aquele,
Grão-senhor do comércio dos marzapos,
Porque a fama gentílica atropele
Da genital enxúndia dos Priapos;
Que do vaso das moças tira a pele,
E costuma fazer-te a crica em trapos,
Quando vermelha e imodesta atura
Da bimbalhada a horrenda embocadura.

III .
Não quero as nove irmãs que, por inuptas,
me não hão-d’influir, sendo donzelas;
desejo um coro de noventa putas
graduadas no exercício de michelas:
Mas se é preciso que, do Pindo, as grutas
tenham parte da voz nas tangedelas,
bastará que me assistam do Parnaso
os colhões e a porra do Pegaso.

IV .
Tu, pai da geração burra castiça,
Escuta do meu verso as rimas toscas,
Em quanto a burrical parda linguiça,
Brandamente à barriga abana as moscas;
Inclina um pouco a orelha dobradiça,
Alargando e encolhendo ao membro as roscas
Ouvirás, inda posto a barlavento,
As fodas do eclesiástico jumento.

V.
Tu, que espalhas semente na Cardiga
Dos melões genitais na cova preta,
Ouve a ardente luxúria d’outra espiga,
Que vestiu com sutana a Chapeleta:
Atende à carne dura que empertiga
Da escória menstrual na suja greta;
Verás que é a mesma em vozes e sussurros
A prosápia dos Barros, e dos burros.

VI.
Não desprezes a oferta petulante,
Que agora te dedico, oh burro amigo!
Burro? Não disse bem; és elefante
A quem nasceu a tromba ao pé do embigo:
Mas se de filhos tens cópia bastante,
Que te deu d’entre as pernas o postigo;
Saiba o mundo, e à gente toda quadre,
Que há burro pai, e que há Martinho padre.

VII.
Era uma tarde quando a terra escalda,
Maleitas influindo o sol vermelho;
E a quente cozinheira erguendo a fralda
Põe no ladrilho as faces do besbelho;
Faz das virilhas com a suja calda
Torcidas dos cadilhos do pentelho;
E a camisa d’estopa na dianteira,
Qu’era almofaça, agora é bigodeira.

VIII.
Quando enfadada a mesma rainha Ginga,
Dos poros, que o calor lhe traz abertos,
Vomitando enxurradas de catinga,
Tem melhores os longes, do que os pertos;
E o triste sapateiro pinga a pinga
Da testa c’o suor rega os enxertos
Das cepas, que a mulher, posta em franquia,
Entre as pernas meteu de mergulhia.

IX.
Finalmente, no intenso ardor da sesta,
Quando até de cantar cansa a cigarra,
‘Stava Martinho, religiosa besta,
De costas posto em cima d’uma barra,
Mostrando da braguilha pela fresta
A disforme cabeça com que marra;
Lampreia no feitio, no ardor forno,
Na cor beringela, na dureza corno.

X.
Maior grossura que a de nove trancas
Foi erguendo a carnal actividade;
Padrão de nervo, que se arrima às ancas,
No estrondoso pespego d’Alvalade;
As coxas lhe serviam d’armas brancas;
E declarando guerra à honestidade,
A guelra encrespa, e a cerviz entona
A disforme serpente caralhona.

XI.
Mas vendo-lhe Martinho o impulso ardente,
Está quieta (lhe diz), oh porra infame! -
Que só pode aturar-te a força quente
Vaso de carne, não, tacho d’arame.
Qual será a mulher viripotente,
Que a menor parte do tesão te mame,
Se lh’encaixas, entrando de boléo,
Uma trave arvorada em mastaréo?

XII.
Bem sei, que foste cavalar-montante,
Que jogando às mãos ambas no pespego,
Rompias pela carne palpitante,
Tornando em fosso da culatra o rego;
E que às pernas da moça mais galante,
Abertas em postura de K Grego,
Lhe arrimas, porque triste não desgoste,
De semente um tonel, de nervo um poste.

XIII.
Sem nunca te chegar fastio ou tédio
Do carnal movimento pegajoso,
Sempre andavas roliço, gordo, e nédio,
Na enchente morna do licor ranhoso:
Estás da mesma forma sem remédio,
D’humana carne hidrópico guloso,
Sem que fartes o génio de milhafre:
Antropófago és, ó Porra cafre.

XIV.
O membro, que até ali ‘steve escutando,
Inclinou a cabeça d’uma ilharga,
Como burro na estrada, que cansando,
Estendido n’areia lança a carga:
Ia-se pouco a pouco espreguiçando,
Como quem prova cousa que lhe amarga;
Mas de golpe caiu, dando o marzapo,
Do Martinho nos queixos um sopapo.

XV.
Mas ele ergue-se logo, e diz atento:
Adverte o teu ardor um pouco vário:
S’és pardal com feitio de jumento,
Não arreies, oh Membro dromedário!
Onde está o contínuo esquentamento
Com que eras fornicante partidário?
Quem te roubou, com mágica tramóia
Tesão de mono em corpo de jibóia?

XVI.
Mas tomara saber: eu não sou frade
P’ra conservar em ti ardor potente?
Para ser, com fradesca gravidade,
Fodedor coroado omnipotente?
Que diria de mim esta cidade,
S’eu foder não quisesse toda a gente?
Mostrando, que inda morto no ferétro,
Só da minha coroa a porra e ceptro?

XVII.
Que conseguiu de Hércules a massa,
Que de Martinho não consiga a porra?
Ele venceu das putas a trapaça;
Eu às putas traspasso a tripa forra.
Se leões vigilantes despedaça,
Este membro ao dragão tira a modorra;
No estreito ele as colunas pôs eternas,
Eu alargo os estreitos d’entre as pernas.

XVIII.
Não respeitara o mundo a Grega ilha,
Que a Apolo levantou fatal colosso,
Se me vira sair pela braguilha
Um guindaste de carne sem ter osso;
E de Tróia a desgraça, ou maravilha,
Suposto ainda o mísero destroço,
Faria no universo mais abalo
Se nascera esta porra ao seu cavalo.

XIX.
Dos raios essa olímpica deidade
Na estátua não fizera eterno risco,
Sabendo que em fogosa liberdade
Alimento entre as peruas um corisco;
Um monstro de carnal actividade,
D’um olho corpulento basilisco,
Qu’erguendo faz em pulos e galopes
Inveja aos Filisteus, pasmo aos Ciclopes.

XX.
Montes de pedra, em que o reino Egípcio
Glorioso eternizou soberba muda,
Mostram no seu pasmoso frontispício
Que acabavam em forma pontiaguda;
Mas a porra de nervo no edifício,
Em toda a parte igual, grossa, e carnuda,
Pegada indica a dois colhões rotundos
Ser padrão, que por base tem dois mundos.

XXI.
Das outras maravilhas curta soma
Nesta porra tem novo desengano
Nela se pode ver d’antiga Roma
Feito em carne o obelisco de Trajano.
Se d’algum temporal, que o Euro assoma,
Caísse a torre ao sacro Vaticano,
Na cabeça do membro rabonório
De nervo tinha a cúpula zimbório.

XXII.
Os heróis todos a perder de vista
Ficaram, e as façanhas d’alta história;
Qu’ este membro do sexo na conquista
Alcança sempre portentosa glória:
O pássaro femíneo a roxa crista
Lhe tributa em aplauso da vitória;
Sendo, apesar do feminil decoro,
Porra Alexandre, porque o vaso é Poro.

XXIII.
A porra, que no pélago salgado
Á vária multidão das fodas muda,
É monstro verde negro e salitrado,
De conchas e d’escama cópia ruda:
Se do hirsuto pentelho emaranhado.
Desenrola a serpente cabeçuda,
E, com pele manchada de sereia,
Um tubarão com barbas de baleia.

XXIV.
Se agora Briareu ressuscitara,
E esse altivo guerreiro centimano
Com todos os seus braços me agarrara
Na disforme estatura d’este cano;
Inda que velho sou, eu lh’encaixara
Nas unhas o tesão da porra ufano,
Por lograr de cem mãos no mesmo instante
Um cento de punhetas d’um gigante.

XXV.
Vamos avante, humana charamela,
Novos regos abrindo em carne crua;
E lavrando nos campos d’arreitela,
De novo s’exercite esta charrua:
Não se perca a menor fornicadela,
Inda sendo no côncavo da lua;
Porque este membro, ao vaso quando toca,
Lhe faz sempre na greta uma barroca.

XXVI.
Disse; e a vista com ramelas podres
Fixa pôs n’alimária corpulenta,
A qual crescendo de semente os odres,
Na testa um olho d’água lhe arrebenta:
Banhara maior vila que a d’Algodres,
No arroto seminal da suja venta,
Se ao feminino forno no basculho
A vómitos chegasse o que era engulho.

XXVII.
Eis senão quando, que na escada sente
Pisar um pé pequeno d’alpargate
E uma mão, que no impulso brandamente
O peito altera quando à porta bate:
Sossega! diz ao membro de repente,
Que já estava com roupas d’escarlate;
E para andar com mais desembaraço,
Debaixo o subjugou do esquerdo braço.

XXVIII.
Eis senão quando vê certa moçoila
A que a mãe e criada vêm seguindo:
Dentes de neve, faces de papoila,
Olhar alegre, buliçoso, e lindo:
Martinho deu-lhe o cheiro da caçoila,
E encrespando o nariz, se ficou rindo;
Ambos pasmaram com igual cuidado;
Mas a moça suspensa, ele arreitado.

XXIX.
O Martinho encostou-se na parede,
E diz logo: Menina, tenho faro
De que vossa-mercê esmola pede
Para missa pedida a Santo Amaro:
S’é este o seu negócio, ou se tem sede,
Entre cá dentro, venha sem reparo;
Que nesta casa as moças mais luzidas,
Entradas querem, porque vêm saídas.

XXX.
Responde a moça : A minha sorte ímpia
Me traz em um negócio com bem ânsia
Porém torna o Martinho: Bom seria
Tratarmos doutro caso d’importância
Para o corpo um bocado de folia
Lhe requer esta minha caralhância;
Ora ature, meu bem, no seu paxocho,
Cinco, ou seis cabeçadas de boi mocho.

XXXI.
Disse: e soltando o membro para baixo,
Só de vê-lo pasmaram as três fêmeas:
Mas o nosso Martinho, feito um macho,
Naquela hora estava posto em gémeas;
Só dizia : Abra as pernas, que lh’encaixo;
Senão hei de fazer-lhe a crica em sêmeas;
Receba este canhão no seu postigo;
Que a mato, se lho meto pelo embigo. .

XXXII.
A Moça diz Oh mãe, que me aconselha?
Isto também sucede a gente branca?
Esta coisa tão grande, e tão vermelha,
Será de pau-brasil alguma tranca?
Ou lagarto, ou madeiro, ou cobra velha ?
De liteira varal, ou alavanca?
Responde a mãe, que na malícia é zorra:
Não, minha filha, não; aquilo é porra.

XXXIII.
A moça desmaiou; mas a mãe: Filha,
(Lhe disse), tem valor, dá jeito à parte;
Que temo que t’estoire uma virilha,
Se torto descarrega o bacamarte;
Vê que o padre, sem freio, nem sarrilha,
Investe como um burro a fornicar-te:
Não lhe sinto remédio, o virgo foi-se;
Mas antes uma foda do que um coice.

XXXIV.
Seja em pé, minha mãe; porque de costas
(Disse a moça, com vozes muito aflitas)
Esta porra me faz a crica em postas,
Qu’em semente depois deixará fritas:
Contra mim as desgraças vêm dispostas;
Porque me hão-de fazer fodas malditas,
Nas cabeçadas da serpente troncha
Ruína a fenda, lagariça a concha.

XXXV.
Botão de rosa unido e nacarado
Era até‘gora, oh mãe, oh meu coninho;
D’um brando pêlo o círculo dourado
Lhe guardava a pureza como arminho:
Nunca possuído, sempre desejado,
Rubim, que o engaste d’ouro fez brinquinho.
Preparando-lhe oculto em sítio breve
A holanda o cofre, agasalho a neve.

XXXVI.
Precioso depósito encarnado
Do mesmo gosto, que rejeita esquivo,
E que troca dos brincos molestado
Em roxo carmesim o coral vivo;
Guardando entre o carmim que o tem cercado
O matiz das violetas sensitivo;
Por mostrar, quando chega ao doce efeito,
Qu’é branca e roxa a cor do amor perfeito.

XXXVII.
Mas d’anel passa agora a largo rombo,
No impulso ardente d’um carnal pepino,
Fazendo a porra, no primeiro tombo,
Boqueirão este vaso pequenino.
Deixar-me-á, com luxúria de mazombo,
O marzapo infernal, burro frontino,
Nas pisadelas com que o molho entorna,
O cu bagaço, o parrameiro dorna.

XXXVIII.
Calou-se; e indo as saias levantando,
O Martinho lhe atira tais porradas,
Que a moça só dizia espoldrinhando
hoje morro cozida a caralhadas!
Mas logo para cima foi saltando,
Por fugir do tesão ás embigadas;
E entrando-lh’entre as pernas o badalo,
No lombo lhe ficou posta a cavalo.

XXXIX.
Porém o grão marzapo, um pouco arfando,
Qual palma, com o peso mais s’erguia;
E o Martinho mordendo, o mais zurrando,
Continua em dar fogo à bateria;
A mãe, que no trabalho os viu lidando,
Com lágrimas nos olhos só dizia;
Quem te fez, minha filha, em breve instante
Rei Mogor posto em cima do elefante.

XL.
Não vale a foda, não, sem cono aberto
(Diz Martinho); eu não quero, isto é matraca;
Menina, Você tem vaso d’enxerto,
E esta porta há mister covão d’estaca.
A mãe, por lhe valer em tal aperto,
Do elefante porral quis ser cornaca;
Monta logo, e ficaram na esparrela;
Porém nas ancas uma, outra na sela.

XLI.
Mas inda sobejava pano à peça
De carne mulheril faminta loba,
A criada mamando-lhe a cabeça,
No vaso Ih’engoliu quase uma arroba.
D’um alcouce, que foi casa professa,
Tinha sido a lacaia mestra-alcoba;
E como sabe a inteligência ao texto,
Fez postilas de Cânones no sexto.

XLII.
O grão Martinho, porque o gosto explique,
Só dizia: Meu bem trabalha agora,
Que a colhoada se me vai a pique
Se o repuxo no lança a carga fora.
Mas neste instante rebentando o dique,
Vazou mais alcatruzes que uma nora;
Parecendo o marzapo um grande açude
Formado em seixo, e derretido em grude.

XLIII.
O selvagem, a tremer para diante,
A pança entona, e a cerviz enrosca,
Parecendo, convulso e palpitante,
Cavalo com terçã, burro com mosca;
Mas deu tal ronco a besta fornicante
Com voz horrível d’alimária tosca,
Qu’estremecem, caindo de pancada
Espavoridas mãe, filha, e criada.

XLIV.
Nunca há-de persuadir maior estrago
Qu’o das três pobres à fecunda ideia
Em chamas a ruína de Cartago
Em ondas o destroço d’Aquileia
Porqu’inundando-as de semente um lago,
Como se acaso as encontrara a cheia,
Ficaram pelo chão todas de costas,
Fodidas, assustadas, descompostas.
XLV.
Corpulento e nervado o carnal maço
Posto em Cascais, fornica na Berlenga:
E temeram quebrar pelo espinhaço,
Se o Martinho intentasse outra fodenga:
Qualquer delas fugindo a tal fracasso,
Como morta na casa se derrenga;
Inculcando da porra impulsos novos,
Ardentes saltos, túmidos corcovos.

XLVI.
Como ao boi da Charneca prevenidos
Rapazes, que um boléo estende absortos,
Por não tornarem logo a ser feridos,
Deitados pelo chão se fingem mortos;
Assim estas três fêmeas, c’os vestidos
Amarrotados, sujos, crespos, tortos,
Evitavam, fugindo das marradas,
Daquele viril touro outras cornadas.

XLVII.
Mas o nosso Martinho diz : Bom olho!
Este acidente o membralhão m’irrita:
Sararão com xarope d’este molho;
Que a porra a mulher morta ressuscita.
A mãe que ainda estava de remolho,
Ouvindo a nova, d’assustada grita;
Levanta-se, fazendo aspecto estranho,
Sacudindo o mongil, sorvendo o ranho.

XLVIII.
E chegando-se à filha com receio,
Que deitada no chão inda jazia,
Lhe diz: A bala não te deu em cheio,
Foi d’esguelha somente uma folia:
Menina, não respondes; porém creio
Que o banho morno te deixou mais fria:
Causou-te este delírio, este desmaio
Da porra a sombra; que faria o raio?

XLIX.
Continua dizendo! Antónia bela,
Qu’infausta foi a luz do teu destino!
Que muito que t’eclipsas, sendo estrela,
Na ponta do badalo d’este sino!
És flor linda, a que rústico atropela
O radical influxo repentino,
Mas para que é deitar este bandalho
Em uma rosa murcha tanto orvalho?

L.
Como tens, minha filha’ amada jóia,
Belo misto de nácar e açucena!
Melhor por um tal caso ardera Troia;
Qu’este roubo é mais rico que o d’Helena.
O meu pesar em lágrimas apoia,
Ver o teu passarinho em tanta pena:
Quebrou-se o brinco, no qual Vénus tinha
De pérolas e púrpura a conchinha.

LI.
Nevada testa, que um jasmim congela,
Desta luz era anúncio refulgente;
E inda sendo por muitas cousas bela,
Por dois motivos é alva certamente;
Suor miúdo como aljôfar nela
Indica dos teus olhos o ocidente;
Porém ao orbe assusta, e ao céu admira,
Que chore a Aurora, quando o sol expira.

LII.
Nas partes, em que a neve quebra a rosa,
Roto em pedaços entra um roxo lírio,
Nestas faces, inteira e primorosa,
Não s’encontra outra flor mais que martírio
A cor perdida, a neve duvidosa
No seu desmaio mostra o teu delírio;
E é somente em teu rosto, amada filha,
A dor perpétua, o estrago maravilha.

LIII.
Troca a horrenda fodaz bestialidade
Carmim brilhante em pálido ametiste,
Roubando-te o tesão rijo d’um frade
O doce arrimo desta idade triste:
Ao sucesso cruel desta impiedade
Ferido o coração pouco resiste;
Pois te deixa d’um membro a força bruta
A flor partida, retalhada a fruta.

LIV.
Responde a filha, e diz: Cá tenho o cono,
Qu’entendi que o levava hoje o diabo;
Porque o padre arreitado como um mono,
A crica me pregou no fim do rabo
Parece que na porra lhe deu sono;
Que me põe, se o negócio leva ao cabo,
Desta casa me erguendo até às ripas,
No sesso os bofes, e na boca as tripas.

LV.
O membro é, minha mãe, uma tormenta
Em que as três todas fomos naufragantes;
D’aquilo deitou muito pela venta
Que s’entorna nas mãos dos estudantes;
Trovoada de Maio, que fermenta
Ardores grossos, águas abundantes;
Pois no impulso, mãezinha da minh’alma,
Certamente lhe achei chuva com calma.

LVI.
Mas a criada, que aturara o mango,
E queria mamar segunda enchente,
Desejando provar outro fandango
Na casca grossa do badejo quente,
Ergueu-se, e disse : Eu tomara um frango
Para dar a minh’ alma de presente;
Só por ver s’inda dava um gritozinho,
Se frango lhe chegasse ao passarinho.

LVII.
Dizendo prosseguiu: Minha menina,
Por levar não s’enfade este soquete;
Rústico arado tronca uma bonina,
Grosseiro pau é pé d’um ramalhete:
Vá aprender, minh’ ama pequenina,
À meter entre as pernas o monete;
Que no rego o jardim, que brilha ufano,
Tanto mais flores tem, quanto mais cano.

LVIII.
Bem sei, que no princípio dá mais jeito
Dos afectos suaves a brandura;
E é razão que primeiro sinta o peito
Dos incêndios d’amor doce quentura ;
E que, trocado em fé todo o respeito,
Chegando o prazo da melhor ventura,
Entre o receio d’um fugir suposto,
O toque é mimo, as lágrimas são gosto.

LIX.
Bem sei que ao roubo meigo d’um beijinho
Torna o susto em carmim cristal nevado,
Tenra a pluma, que adorna o passarinho,
Curto o bico, que Amor fez encarnado;
E que encontrando no encoberto ninho
Do boril doce o sitio desejado,
Entra, fazendo glória da porfia,
Na dor que alegra o golpe que alivia.

LX.
Porém a tudo excede um grão porraço,
Que de três léguas na distância arreita;
Uma porra torcida como um braço,
Que é vara de lagar que está direita;
Assim no fornicar de calhamaço,
Porra disforme é praga sem suspeita;
Arrumando no vaso, a que sacode,
Grandeza de Frizão, calor de bode.

LXI.
Menina, na fodenga há forte inércia :
Que tamanho será, Senhora Antónia,
O marzapo do grão Sofi da Pérsia
E a porra do Sultão de Babilónia?
O vaso quer tesão, não quer solércia:
O foder nesta terra é cerimónia;
Só m’enche a vastidão imaginária
A porra do grão Kan da Grã-Tartária.

LXII.
Um noivado na corte não faz vasas
Se de fora não vem tudo que enfeita:
A dama manda a França, quando casa;
Porem manda à Turquia, quando arreita.
S’eu no mundo não fora mulher rasa,
Já estava destas cousas satisfeita;
Eu tivera, em lugar de louça fina,
Caralhos de Timor, colhões da China.

LXIII.
Diz Martinho : O trabalho era perdido;
Que à vista deste frade desprezado
D’Irlanda um caralhão louro e comprido,
E dos Cafres um membro assalvajado;
Em Bengala com juncos estendido,
N’Angola sempre d’um jugo estirado;
Pois é o meu porrão, cantado em verso,
Caralhíssimo-mor do Universo.

LXIV.
Tanto é o de mais, quanto o de menos;
Porque esse tassalhão (diz a criada)
De longe uma mulher de dois acenos
Deixará trinta vezes fornicada:
Os grandes são melhores que os pequenos;
Porem essa façanha desmarcada,
Quando entra, degola, abrasa, esmecha
Nero da crica, Herodes da ventrecha.

LXV.
Cá em casa um fradete em mim se vinga
Que é primo da senhora, e é capacho:
Ele sim, tem de carne uma seringa
De côvado, que mete no meu tacho;
Sem que chegue por fora a entornar pinga
Lhe espremo todo o sumo do seu cacho
Assim m’esfrega sempre, e não m’esfola;.
Eu o alivio, e ele me consola.

LXVI.
É n’esta opinião que certa moça
Me afirmava, por ser na foda esperta,
Que tanto alarga o membro quando roça,
Como aflige no vaso quando aperta;
E a mulher quente, que procura a coça,
Furada deve ser, sem ser aberta:
Pois nunca será bom membro que o encalha;
Que a crica folga, quando a porra balba.

LXVII.
Porém vossa mercê vá-se a Galiza,
Pois sem ser padre mestre, é padre meco;
Que ao vaso o membralhão estala e pisa,
Em praça transformando o que era beco;
Martinho, ou Julião, que se divisa
De carne no estrondoso badameco,
Julgando que das suas fodedelas
Inda o mundo todo será Frielas.

LXVIII.
Mas ainda assim queremos que nos conte,
Porque há de saber tudo de memória,
Quem lhe deu este membro rodamonte,
Donde veio esta porra dormitória,
D’este mar de semente toda a fonte,
D’esse grande tassalho toda a história;
Pois, visto tanto molho que derrama,
É marzapo geral na voz da Fama.

LXIX.

Proferiu o Martinho já roncando:
Toda a mulher pergunta por teimosa:
Este membro crescido e venerando
Páginas há-de ter em verso e prosa:
Já que quer, eu lhe vou logo arrumando;
Aplique o ouvido um pouco cuidadosa;
Pois não dá esta porra em todo o caso
Menos gosto na orelha, que no vaso.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Máximas Latinas - II

-
-
-


Mulier, cum sola cogitat, male cogitat.
----------------Publilius Syrius, Sententiae 335

Quando uma mulher pensa sozinha, pensa mal.


Mulier quae multis nubit, multis non placet.
----------------Publilius Syrius, Sententiae 340

A mulher que casa muitas vezes, não agrada a muitos.


Multis placere quae cupit, culpam cupit.
----------------Publilius Syrius, Sententiae 351

A mulher que quer agradar a muitos, sente-se por isso culpada.


Exstructum super cloacam templum forma est mulieris.
----------------Caecilius Balbus, Sententiae 65

A beleza da mulher é um templo erigido sobre uma cloaca.


Non est ulla tam bona uxor, de qua non possis queri.
----------------Caecilius Balbus Sententiae 134

Não há nenhuma mulher casada que seja tão perfeita, que se não possa queixar-se dela.


Nec mutuam repertam ullam esse mulierem.
----------------Plautus, Aulularia, 125

Nunca se descobriu mulher alguma, a quem se lhe tenham esgotado as palavras.


Varium et mutabile semper femina
----------------Virgílio, Eneida, 5, 569.

Toda a mulher é caprichosa e volúvel.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Máximas Latinas - I

-
-
-

Aut amat aut odit mulier, nil est tertium.
--------------Publilius Syrius, Sententiae 6


A mulher, ou ama ou odeia, não há terceira hipótese.


Animo virum pudicae, non oculo eligunt.
--------------Publilius Syrius, Sententiae 36

As mulheres castas escolhem o homem com o coração, não com o olhar.


Casta ad virum matrona parendo imperat.
--------------Publilius Syrius, Sententiae 93

A mulher honesta domina o seu marido, ao mesmo tempo que lhe obedece.


Dedicere flere feminae in mendacium.
--------------
Publilius Syrius, Sententiae 130

As mulheres aprenderam a chorar, para melhor mentirem.


Feminae naturam regere desperare est otium.
--------------Publilius Syrius, Sententiae 187

Querer mudar a natureza da mulher, é tempo perdido.


Malo in consilio feminae vincunt viros.
--------------Publilius Syrius, Sententiae 324

No que toca a maus conselhos, as mulheres ultrapassam os homens.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

As mulheres de Roma - II

-
-
-.


D.M. Scriboniae Hedone Q. Tampius Hermores coniugi karissimae fec.,
con qua vix. an. XVIII sine querella, cuius desiderio iuratus se postea uxore non habituru.

----------------Corpus inscriptionum Latinarum (CIL)
----------------XI 1491



Scribonia Hedone

Para os Manes de Scribonia Hedone, para sua querida esposa, fez Quintus Tampius Hermores esta sepultura;
viveu com ela 18 anos sem uma única discussão; pela saudade que dela tem, jurou ele que nunca mais teria mulher alguma
.



Hic iacet Aufidia Severina signo Florenti,
bis quinos denos quae vixit annos aetatis.
Casta fide semper toru maritale dilexit
sobria, non moecha, simplex animo benigno,
dedita coniugi soli suo, ignara alienum.
Conpari dulci suae incomparabili solae
Basileus fecit, quod fieri ab illa cupiebat.

----------------Corpus inscriptionum Latinarum (CIL)
----------------VI 34 060


Aufidia Severina

Aqui jaz Aufidia Severina, que tinha como sobrenome Florência,
a qual viveu duas vezes 15 anos.
Casta e fiel, sempre honrou o leito matrimonial;
sóbria, não adúltera, era simples, amigável,
dedicada apenas a seu marido, ignorando os das outras.
Para a sua querida, inesquecível, única esposa, fez Basileus
O que desejava que para ele ela tivesse feito.



Incomparabilis coniux, mater bona, avia piissima, pudica,
religiosa, laboriosa, frugi, efficaxs, vigilans, sollicita, univira,
unicuba, [t]otius industriae et fidei matrona.

----------------Inscriptiones Latinae selectae (DE) 8444
---------------((Thelepte, Numidien)


Postumia Matronilla

Uma incomparável esposa, boa mãe, avó bondosíssima, púdica, piedosa,
trabalhadora, frugal, eficiente, cuidadosa, amável; casou apenas uma vez,
com um só partilhou o leito; totalmente, mulher de trabalho e de confiança.





Anni, vota simul, heheu quam parva fuerunt!
Heu quam vita brevis, quam breve coniugium!
Aetas sola minor, nam cetera maxima Festae:
adfectus, pietas, forma, pudicitia.


----------------Carmina Latina epigraphica (CE) 1443 A
----------------(Narbonne/ Narbo)

Festa

Os anos em comum, ai de mim, foram tão poucos!
Ai, que vida tão curta, que casamento tão breve!
Mas de Festa, apenas a idade era pouca, tudo o resto era enorme:
O afecto, a devoção, a beleza, o pudor.

terça-feira, 6 de julho de 2010

As mulheres de Roma - I

-
-


Hic sita est Amymone Marci optima et pulcherrima, lanifica, pia, pudica, frugi, casta, domiseda.

-----------------Corpus inscriptionum Latinarum (CIL), VI, 11, 602

Eis Amimone, esposa de Marcos, muito boa e muito bonita, fiandeira de lã: é afectuosa, púdica, frugal, casta e caseira.



(Mulier) imprudens animal est et, nisi scientia accessit ac multa eruditio, ferum, cupiditatium incontinens.

-----------------Seneca, De constantia sapientis

A mulher em si é animal imprudente e, a menos que tenha estudado e adquirido muitos conhecimentos, feroz e sem limite nos caprichos.

domingo, 6 de junho de 2010

Leitura recomendada




Recomendo vivamente a leitura do texto indicado a seguir. Como se constata pelo título, não era inicialmente uma obra anti-esclavagista. Mas os horrores que narra e o modo como o faz, dão como resultado a abominação daquele horrível negócio. José Capela, do Porto, mudou-lhe em 1977 o título e é agora conhecido como "Memória a respeito dos escravos e tráfico da escravatura entre a costa d’África e o Brasil".


Memórias Económicas da Academia Real das Sciencias e Lisboa, para o adiantamento da agricultura, das artes, e da indústria em Portugal e suas conquistas, Tomo IV, 1812, pags. 1 a 64, com o título “Discurso Académico ao Programa: Determinar com todos os seus symptomas as doenças agudas, e chronicas, que mais frequentemente accommettem os Pretos recem-tirados da Africa: se talvez a mudança do clima, se a vida mais laboriosa, ou se alguns outros motivos concorrem para tanto estrago: e finalmente indicar os methodos mais apropriados para evitalo, prevenindo-o, e curando-o. Tudo isto deduzido da experiencia mais sizuda, e fiel”.

Online,
aqui


EDIÇÕES:


Luis António de Oliveira Mendes, Memória a respeito dos escravos e tráfico da escravatura entre a Costa d'África e o Brasil. Pref. de José Capela, Porto, Escorpião, 1977.


Luis António de Oliveira Mendes, Discurso acadêmico ao programa: Determinar com todos os seus sintomas as doenças agudas, e crônicas, que mais freqüentemente acometem os pretos recém-tirados da África, in: Carreira, Antônio. As companhias pombalinas de Grão-Pará e Maranhão e Pernambuco e Paraíba. 2ª ed. Lisboa: Editorial Presença; 1983. Apêndice, p. 364-420.


Luis António de Oliveira Mendes, Memória a respeito dos escravos e tráfico da escravatura entre a Costa d'África e o Brasil, ISBN: 8589655113, Salvador de Bahia, Brasil, Theatro/P555 Edições, (Coleção auto-conhecimento Brasil), 2004., 107 p.


Luis António de Oliveira Mendes, Memória a respeito dos escravos e tráfico da escravatura entre a costa d’África e o Brasil (1812). Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental ISSN 1415-4714, São Paulo - Brasil, vol. 10, n. 2, p. 362-76, jun. 2007.



segunda-feira, 17 de maio de 2010

ANGOLA

................

................NATIONAL

..............GEOGRAPHIC


July 1910, p. 625



ANGOLA, THE LAST


FOOTHOLD OF SLAVERY



ANGOLA, the Portuguese colony on the West Coast of Africa, is a country about as large as France, Switzerland, and Italy combined. Its coast-line on the Atlantic is nearly 1,000 miles in length and has many good harbors. For every thousand people who have heard of the Congo Free State, which borders on the east and north, it is possible that two have heard of Angola, and perhaps one of those knows that from a time some score of years before the inauguration of the Congo State to the present day there has existed in that country a system of slavery which is only comparable with that of the Spaniards in the West Indies. Slaves are brought down from the far interior, often as far as 800 miles, by agents who think they have done well if one-half of their drove survive the journey. At the coast, knowing that it is impossible for them to return home, the slaves bind themselves to a term of service "indentured labor," it is called which never ends, and are shipped to the cocoa plantations of the islands of Saint Thome and Principe.


Angola is classed as a country poor in natural products of the soil and in minerals, but still moderately rich in men, in spite of having been squeezed for generations by the Portuguese. The principal agricultural products are manico, coffee, bananas, sugar-cane, and tobacco. The trade is mostly with Portugal, the chief exports being coffee, rubber, ivory, wax, fish, and palm oil.

The capital of Angola is Loanda, or Saint Paul de Loanda, as it was christened, the oldest Portuguese settlement south of the Equator and once the center of the slave trade between Africa and Brazil. Its splendid harbor offers a safe haven, and it boasts of a mixed population of about 25,000. For administrative purposes the colony is divided into five districts, and at the head is a governor appointed by the Portuguese. The population is estimated at 5,000,000, the greater portion natives, and the number of Europeans being only about 4,000. They have, however, exercised a great modifying influence on the native population inhabiting the western part of the colony as regards their customs and economic condition.



Transcrição sugerida pela leitura do artigo “O país pobre, bonito e honrado da National Geographic”, de Luis Villalobos, na PÚBLICA, de 16 de Maio de 2010


segunda-feira, 10 de maio de 2010

Trava-línguas - Trabalenguas - Scioglilingua - Virelangue - Tongue twister - Zungenbrecher





O rato roeu a rolha
Da garrafa do rei da Rússia.


Paulino sem pau é lino
Paulino sem lino é pau
Tirando o pau ao Paulino
Fica o Paulino sem pau.


Pardal pardo porque palras?
Eu palro e palrarei,
porque sou pardal pardo
palrador d'El-Rei.


Uma aranha dentro da jarra. Nem a jarra arranha a aranha nem a aranha arranha a jarra.


Compadre, cómprame un coco. Compadre, coco no compro, que el que poco coco come, poco coco compra.


Apelle, figlio di Apollo
Fece una palla di pelle di pollo
Tutti i pesci vennero a galla
Per vedere la palla di pelle di pollo
Fatta da Apelle figlio di Apollo


Sopra la panca la capra campa,
sotto la panca la capra crepa.


Sotto le frasche del capanno
quattro gatti grossi stanno;
sotto quattro grossi sassi,
quattro gatti grossi e grassi.



Sachant en chasseur avisé qu’un chasseur sachant chasser sait chasser sans son chien de chasse.


She sells sea shells by the sea shore.
The shells she sells are sure sea shells.


Fischers Fritz fischt frische Fische. Frische Fische fischt Fischers Fritz

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Infinito, de Giacomo Leopardi (1819)





Sempre caro mi fu quest'ermo colle,

e questa siepe, che da tanta parte

dell'ultimo orizzonte il guardo esclude.

Ma sedendo e mirando, interminati

spazi di là da quella, e sovrumani

silenzi, e profondissima quiete

io nel pensier mi fingo; ove per poco

il cor non si spaura. E come il vento

odo stormir tra queste piante, io quello

infinito silenzio a questa voce

vo comparando: e mi sovvien l'eterno,

e le morte stagioni, e la presente

e viva, e il suon di lei. Così tra questa

immensità s'annega il pensier mio:

e il naufragar m'è dolce in questo mare.





Sempre cara me foi esta colina
Erma esta sebe, que de extensa parte
Dos confins do horizonte o olhar me oculta.
Mas, se me sento a olhar, intermináveis
Espaços para além, e sobre-humanos
Silêncios e quietudes profundíssimas,
Na mente vou sonhando, de tal forma
Que quase o coração me aflige. E, ouvindo
O vento sussurrar por entre as plantas,
O silêncio infinito à sua voz
Comparo: é quando me visita o eterno
E as estações já mortas e a presente
E viva com os seus cantos. Assim, nessa
Imensidão se afoga o pensamento:
E doce é naufragar-me nesses mares.




domingo, 21 de março de 2010

Poesia erótica





Johnny took Joan by the arm
And led her unto the haycock;
And yet he did her no harm,
Although he felt under her smock.
........Although he did touse her,
........Although he did rouse her
Until she backwards did fall,
........She did not complain
........Nor his kindness refrain,
But prayed him to put it in all.

De Love’s Masterpiece, 1683



João e Maria

João pegou Maria pelo braço
E gentil levou-a atrás da moita
Mas não lhe tirou nenhum pedaço:
Sob a saia, a sua mão afoita
........Só a pôs em desalinho
........Com o fervor dos carinhos.
E qual ela se deitou, matreira,
........Não opôs, tenho a certeza
........Nenhum estorvo à gentileza:
Pediu-lhe, antes, que a enfiasse inteira.




A monarch I’ll be when I lie by thy side.
And thy pretty hand my sceptre shall guide.

De Wit’s Cabinet, aprox. 1700


O MONARCA

Um monarca eu serei quando, estendido ao teu lado,
O meu ceptro for por tua linda mão guiado.




Cum monachus monacham premeret gemibunda, ‘Mihi’ inquit
........‘Væ miseræ hæc ludrica perdo animam.’'
Quam pius antistes verbis solatur amicis,
........Inguinaque inguinibus, osculaque ora tegens,
‘Hos aditus ego præcludam, tu, ne exeat’ inquit,
........‘Quicquam animæ porta posteriore, cave’.

...........................George Buchanan (1506 - 1582)


As a monk was lying on top of a nun, she groaned out: “Alas I’m losing my soul in this sporting!’ The pious priest consoles her with loving words, covering her loins with his loins, her mouth with his lips. ‘I’ll close off these exits,’ he said, ‘you make sure that no part of your soul gets out by the back door.’




Se tu fussi ‘na carcarazza
e eu fussi 'nu rusignolu,
aprarissi ssa hiangazza
mu ti ‘mbiscu stu pisciolu.

Folclore da Calábria


Se tu fosses uma pega
e se eu fosse um bacurau,
farias da tua greta
um ninho para o meu pau.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Janelas Altas, de Philip Larkin




Quando vejo um casal de miúdos
E percebo que ele a anda a foder e ela
Usa um diafragma ou toma a pílula
Sei que isto é o paraíso

Com que os velhos sonharam toda a vida –
Compromissos e gestos postos de lado
Que nem debulhadora fora de moda,
E toda a gente nova a descer pelo escorrega,

Interminavelmente, para a felicidade. Será
Que alguém olhou para mim há quarenta anos,
E pensou: Isso é que vai ser boa vida,
Nada de Deus ou de suores nocturnos,

Ou medo do inferno, ou ter de esconder
Do padre aquilo em que se pensa. Ele
E a malta dele, c’um raio, hão-de ir todos pelo escorrega
Abaixo, livres que nem pássaros?
E de imediato

Em vez de palavras, vêm-me à ideia janelas altas:
O vidro que acolhe o sol, e mais além
O ar azul e profundo, que não revela
Nada e está em lado nenhum e não tem fim.

Tradução de Rui Carvalho Homem, em Philip Larkin, Janelas Altas, Poesia, Edições Cotovia, Lisboa, 2004, ISBN 972-795-087-6



Original


High Windows


When I see a couple of kids
And guess he's fucking her and she's
Taking pills or wearing a diaphragm,
I know this is paradise

Everyone old has dreamed of all their lives--
Bonds and gestures pushed to one side
Like an outdated combine harvester,
And everyone young going down the long slide

To happiness, endlessly. I wonder if
Anyone looked at me, forty years back,
And thought, That'll be the life;
No God any more, or sweating in the dark

About hell and that, or having to hide
What you think of the priest. He
And his lot will all go down the long slide
Like free bloody birds.
And immediately

Rather than words comes the thought of high windows:
The sun-comprehending glass,
And beyond it, the deep blue air, that shows
Nothing, and is nowhere, and is endless.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Manuscrito Anónimo de cerca de 1610




-¿Qué me quiere, señor ? -Niña, hoderte.
-Dígalo más rodado. -Cabalgarte.
-Dígalo a lo cortés. -Quiero gozarte.
-Dígamelo a lo bobo. -Merecerte.

-¡Mal haya quien lo pide de esa suerte,
y tú hayas bien, que sabes declararte!
y luego ¿qué harás ? -Arremangarte,
y con la pija arrecha acometerte.

-Tú sí que gozarás mi paraíso.
-¿Qué paraíso ? Yo tu coño quiero,
para meterle dentro mi carajo.

-¡Qué rodado lo dices y qué liso!
-Calla, mi vida, calla, que me muero
por culear tiniéndote debajo.




quarta-feira, 3 de março de 2010

A TORRE DE BABEL OU A PORRA DE SORIANO





Eu canto do Soriano o singular mangalho!
Empresa colossal! Ciclópico trabalho!
Para o cantar inteiro e para o cantar bem
precisava viver como Matusalém.
Dez séculos!

Enfim, nesta pobreza métrica
cantemos essa porra, porra quilométrica,
donde pendem colhões que idéia vaga
das nádegas brutais do Arcebispo de Braga.

Sim, cantemos a porra, o caralho iracundo
que, antes de nervo cru, já foi eixo do Mundo!
Mastro de Leviathan! Iminência revel!
Estando murcho foi a Torre de Babel
Caralho singular! É contemplá-lo
É vê-lo teso!
Atravessaria o quê?
O sete estrelo!!

Em Tebas, em Paris, em Lagos, em Gomorra
juro que ninguém viu tão formidável porra
É uma porra, arquiporra!
É um caralhão atroz
que se lhe podem dar trinta ou quarenta nós
e, ainda assim, fica o caralho preciso
para foder a Terra, Eva no Paraíso!!

É uma porra infinita, é um caralho insone
que nas roscas outrora estrangulou Laoccoonte.

Oh, caralho imortal! Oh glória destes lusos!
Tu podias suprir todos os parafusos
que espremem com vigor os cachos do Alto Douro!
Onde é que há um abismo, onde há um sorvedouro
que assim possa conter esta porra do diabo??!
O Marquês de Valadas em vão mostra o rabo,
em vão mostra o fundo o pavoroso Oceano!
– Nada, nada contém a porra do Soriano!!

Quando morrer, Senhor, que extraordinária cova,
que bainha, meu Deus, para esta porra nova,
esta porra infeliz, esta porra precita,
judia errante atrás duma crica infinita??
– Uma fenda do globo, um sorvedouro ignoto
que lhe dá de abrir talvez um dia um terramoto
para que desague, esta porra medonha,
em grossos borbotões de clerical langonha!!!

A porra do Soriano, é um infinito assunto!
Se ela está em Lisboa ou em Coimbra, pergunto?
Onde é que ela começa?
Onde é que ela termina
essa porra, que estando em Braga, está na China,
porra que corre mais que o próprio pensamento
que porra de pardal e porra de jumento??
Porra!

Mil vezes porra!
Porra de bruto
que é capaz de foder o Cosmo num minuto!!


........................GUERRA JUNQUEIRO

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Francisco Manuel do Nascimento, Filinto Elísio (1734 - 1819)




Cristo morreu há mil e tantos anos;
Foi descido da cruz, logo enterrado;
E ainda assim, de pedir não têm cessado
Para o sepulcro dele os franciscanos!

Tornou a ressurgir dentre os humanos;
Subiu da terra ao céu, lá está sentado;
E à saúde dele sepultado
Bebem (o saco o paga) estes maganos:

E cuida quem lhes dá a sua esmola
Que eles a gastam em função tão pia...
Quanto vos enganais, oh gente tola!

O altar mor, com dois cotos se alumia:
E o frade, co'a putinha, que o consola,
Gasta de noite o que lhe dais de dia.

Filinto Elísio
Obras completas, 1817-1819, IV, 149






Elegia (tradução de Ovídio)

Partia o dia em meio o Sol calmoso;
Reclino o corpo a descansar no leito,
Mal aberta janela, e mal cerrada;
Qual usa permoiar a luz nos bosques,
Qual crepúsculo deixa, ao despedir-se,
Febo, ou foge a Noite, à vista da Alva
Luz, que convem às Moças vergonhosas,
E em que o tímido pejo ache esconderijo.
Eis vem Corina, em mal-cingidas roupas,
( Solta a madeixa o níveo peito oculta)
Qual Semiramis ( diz-se ) ao leito fora,
Gentil; e fora Lais, de muitos Dama.
Dispo-lhe a roupa, ( que empecia pouco
De rara ) Ela pugnava por cobrir-se
Mas, como quem não quer vencer, pugnava.
Mal esteve ante meus olhos toda nua,
Não lhe vi um senão no corpo todo.
Quais vi, quais os palpei, ombros e braços!
Quais maminhas tão guapas de empalmá-las!
Quão liso o ventre desce do alto peito!
Que cintura, e infantis, roliças coxas!
Que mais direi! mimoso é quanto hei visto,
E toda c’o meu corpo a cingi nua.
Que há mais que ouvir ? Cansámos, descansámos,
Corram-me a fio tais os meios dias.

Filinto Elísio
Obras completas, 1817-1819, V, 439




Original

aestus erat, mediamque dies exegerat horam;
adposui medio membra levanda toro.
pars adaperta fuit, pars altera clausa fenestrae,
quale fere silvae lumen habere solent,
qualia sublucent fugiente crepuscula Phoebo,
aut ubi nox abiit, nec tamen orta dies.
illa verecundis lux est praebenda puellis,
qua timidus latebras speret habere pudor.
ecce, Corinna venit, tunica velata recincta,
candida dividua colla tegente coma,
qualiter in thalamos famosa Semiramis isse
dicitur, et multis Lais amata viris.
deripui tunicam; nec multum rara nocebat,
pugnabat tunica sed tamen illa tegi;
quae cum ita pugnaret, tamquam quae vincere nollet,
victa est non aegre proditione sua.
ut stetit ante oculos posito velamine nostros,
in toto nusquam corpore menda fuit:
quos umeros, quales vidi tetigique lacertos!
forma papillarum quam fuit apta premi!
quam castigato planus sub pectore venter!
quantum et quale latus! quam iuvenale femur!
singula quid referam? nil non laudabile vidi,
et nudam pressi corpus ad usque meum.
cetera quis nescit? lassi requievimus ambo.
proveniant medii sic mihi saepe dies.


sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

AT HOME IN THE WORLD, by Joyce Maynard



EXTRACTS


What I see in Jerry Salinger—and this is far more significant for me than his literary celebrity—is the possibility that there may be another human being on the planet in whose presence I won’t need to conceal my true identity. What’s the desire of a boy to kiss me or have sex with me, compared to the extraordinary sense of relief and comfort of finding a fellow human being who recognizes and embraces me like a long-lost countryman? It’s not his fame as a writer that draws me to him. It’s his voice. Eventually I will come to love his voice on the phone, his voice in the room with me. But what I love first is his voice on the page […]

As I become familiar with his voice in the pages of his letters, I recognize a certain irony to the way that J.D. Salinger is worshiped by so many of my contemporaries. The actual man behind the beloved character of Holden Caulfield, and the characters of the Glass family, possesses contempt for much of what young people embrace on campuses like mine. Jerry despises what he perceives as the watered-down variety of Eastern mysticism popularized by the Beatles’ visit to India with the Maharishi. He barely mentions politics or world affairs—even in this election year, with the Vietnam War still going on, and the early news of the Watergate break-in soon to hit the news. When he does speak of student activism of the kind that’s going on around the country at the moment, it is largely to question the motives behind students’ seemingly liberal politics, and above all else, the adherence to fashion and convention—even the adherence to the fashion of unconventionality […]

“There’s so much perversion all around me,” I write to Jerry.

Perversions! He responds. Oh yes: spiritual, cultural, sexual.

Seemingly out of nowhere he brings up Masters and Johnson, whose names are much in the news this year for their sex-therapy practices and the clinics they’ve set up treating couples with sexual problems. Jerry has never mentioned sex in any of his letters but now he tells me that the publication of the Masters and Johnson report is one of the most destructive things that young people could have been subjected to. The whole thing is a sham, he says, because it comes out of times absent of all “orgasmic normalcy.” I don’t have a clue what he means, but I hang on his words.

His references are an odd mix: Masters and Johnson, Hemingway, Ring Lardner, Lao Tse. Nineteen forties New York, 1970s television; the tweedy world of the Carlyle Hotel, The New Yorker, Westport, Connecticut, and the Biltmore, the ungentrified life of rural New Hampshire. In his early days, he hung around places like the Stork Club in New York with Eugene O’Neill’s daughter Oona before she married Charlie Chaplin—a marriage that took place when she was 18 and he was 53.

Jerry doesn’t go out on the town anymore. His two most frequent visitors in Cornish are a couple in their 60s, Eva and Vernon Barrett, who clean and do odd jobs for him, and a young housewife in town named Sally Kemp, who comes over to study homeopathy with him.

He’s still a New Yorker. Now and then in a letter he’ll mention having a telephone conversation with S.J. Perelman—Sid—or going in to Manhattan to have lunch with William Shawn, editor of The New Yorker magazine, or getting a visit from a couple of longtime New Yorker writers who stop for lunch on their way back from a visit to Cape Cod. But mostly his visits will be with Sally, to work on homeopathy, and the Barretts, with whom he discusses his compost pile, or cordwood, or his tomato plants. He talks to me a lot about writing, but never about writers, except dead ones, and never about the current literary scene, which he avoids. (Though he eventually mentions a particular loathing for John Updike, who once published a highly critical piece about his work.) He writes about his dachshund, Joey, a trip to the health food store in White River Junction, a bet with Matthew that entailed not shaving for a week, getting his car fixed.

In one of my letters I ask him, with a kind of innocence you have to be 18 to possess, if he’s been doing any writing lately. He responds that he writes everyday. Always has. As our friendship develops, he speaks about his writing just in passing, as if that goes without saying, and occasionally he will speak of having had one of those weeks where most of the pages end up in the trash.

One day, near the end of the spring term, I ride my bike over to the Yale Coop and pick up a copy of Catcher in the Rye with its familiar red jacket. It’s an odd feeling, seeing the name I know from a handwritten signature on a page, printed yellow in letters on the cover. Standing in line to buy the book, I feel almost embarrassed, as if I were buying contraceptives or The Story of O. I stuff the book in my bag and carry it back to my dormitory room. I spend the afternoon reading it.

Although this is my first exposure to Salinger’s published work, the voice in the novel is instantly recognizable. It could be Jerry talking. It’s not just that Jerry has inserted so many of his opinions—about movies, or books, or actors, or music—into Catcher in the Rye. What’s familiar is the point of view and the eye of the young Holden Caulfield, which is very nearly the same as the man with whom I have been corresponding these last few weeks.

I read with particular interest the passages in Catcher in the Rye that involve Holden’s dealings with girls. Like me, Holden Caulfield remains a virgin, maintaining that he has had plenty of opportunities to change this. In Holden’s case, he just hasn’t got around to it. Sex has a significance for him that makes it impossible for him to embark on in a casual way. He has to like the girl a whole lot. But in the end, the only girl he really loves is his little sister.

The portrait of Phoebe, the tenderness with which Jerry portrays her, makes all other girls in the novel seem corrupt and practically ugly by comparison. Reading his description of Phoebe makes me love her. I want Jerry to feel, about me, the way he does about Phoebe.

The next time I write to Jerry after finishing the book, I ask him only one question about it: How did Holden Caulfield ever manage to fit so many activities into a single night?

He answers back that he has no idea; we’d have to ask someone really smart. Maybe my mother’s friend, the famous psychologist.

Another time, he will explain to me how he came up with the name of Holden Caulfield (names on a movie marquee: William Holden and Joan Caulfield). Once or twice over the months to come he refers to somebody or other trying to obtain movie rights to the novel—something he’ll never sell. Other than this, Jerry and I don’t discuss the contents of Catcher in the Rye again.


domingo, 17 de janeiro de 2010

MEMOIRES DE CASANOVA




Orage favorable


Mon affliction était si grande que je devais ou la sauter à pieds joints, ou partir. Ce qui me donna un puissant élan fut la figure, et encore plus le caractère tout à fait nouveau pour moi de la nouvelle mariée. Sa sœur était plus jolie, mais une novice commençait à m’alarmer : j’y voyais trop de besogne.

Cette nouvelle mariée, âgée de dix-neuf à vingt ans, attirait l’attention de toute la compagnie par ses manières empruntées. Parleuse, la mémoire farcie de maximes, souvent à perdre de vue, et dont elle croyait devoir faire parade, dévote et amoureuse de son mari jusqu’à ne point cacher la peine qu’elle éprouvait à table lorsque assis en face de sa sœur, il s’en montrait enchanté, elle prêtait beaucoup au comique. Son mari était un étourdi qui peut-être aimait beaucoup sa femme, mais qui, par bon ton, croyait se devoir montrer indifférent. et qui, par vanité, trouvait plaisir à lui donner des motifs de jalousie. A son tour, elle avait peur de passer pour sotte en ne les relevant pas. La bonne compagnie la gênait précisément parce qu’elle voulait y paraître faite. Quand je débitais des sornettes, elle m’écoutait attentivement, et, voulant ne pas paraître bornée, elle riait hors de propos. Sa singularité, ses gaucheries et sa prétention me donnèrent envie de mieux la connaître, et je me mis à lui faire ma cour.

Mes soins grands et petits, mes attentions, mes singeries mêmes, tout fit bientôt connaître à chacun que j’avais jeté un dévolu sur elle. On en avertit publiquement le mari qui, faisant l’intrépide, avait l’air de plaisanter quand on lui disait que j’étais redoutable. De mon coté, je contrefaisais le modeste et parfois l’insouciant. Quant à lui, conséquent dans son rôle, il m’excitait à cajoler sa femme qui, à son tour, jouait for mal la disinvolta.

Il y avait cinq ou six jours que je lui faisais assidûment ma cour, quand, me promenant avec elle dans le jardin, elle eut l’imprudence de me dire les raisons de ses inquiétudes et le tort que son mari avait de lui en donner des motifs. Je lui dis avec le ton de l’amitié que le moyen le plus propre à le corriger était de ne point paraître s’apercevoir des préférences de son mari pour sa sœur, et de faire semblant d’être amoureuse de moi ; et pour mieux l’engager à suivre mes conseils, je lui dis que ce que je lui proposais était difficile, et qu’il fallait avoir beaucoup d’esprit pour jouer un rôle aussi faux. J’avais touché le point sensible, car elle m’assura qu’elle le jouerait à merveille : malgré son assurance, elle s’en acquitta si mal que tout le monde s’aperçut que le projet était de mon cru.

Quand je me trouvait seul avec elle dans les allées du jardin, sûr que nous n’étions vus de personne, et que je voulais la mettre tout de bon à son rôle, elle employait le dangereux moyen de s’enfuir, me laissant seul, et allait rejoindre ainsi la société ; de sorte que, quand je reparaissais, on ne manquait pas de m’appeler mauvais chasseur. Je ne manquais pas de lui reprocher sa fuite dès que j’en trouvais l’occasion, et de lui représenter le triomphe qu’elle préparait par là à son mari. Je louais son esprit, je déplorais son éducation ; je lui disais que le ton et les manières que je prenais avec elle étaient ceux de la bonne compagnie, et qu’elles prouvaient tout le cas que je faisais de son esprit ; mais, au milieu de mes beaux discours, le onze ou douzième jour elle me déconcerte en me disant qu’étant prêtre je devais savoir que toute liaison amoureuse était un péché mortel, que Dieu voyait tout, et qu’elle ne voulait ni se damner, ni s’exposer à dire à un confesseur qu’elle s’était oublié au point de pécher avec un prêtre. Je lui objectai que je n’était point prêtre, mais je fus terrassé lorsqu’elle me demanda si ce que je voulais entreprendre était au nombre des péchés ; car, n’ayant pas eu le courage de le nier, je sentis que je devais en finir.

La réflexion m’ayant facilement rendu calme, ma nouvelle conduite fut remarquée à table, et le vieux comte, d’un caractère plaisant, disait hautement que cela annonçait une affaire faite. Je crus la chose favorable, je dis à ma cruelle dévote que le monde en jugeait ainsi ; mais j’y perdais mon latin : le hasard me servit mieux et voici ce qui amena le dénouement de cette intrigue.

Le jour de l’Ascension nous allâmes tous faire une visite à Mme Bergali, célèbre dans le Parnasse italien. Devant retourner à Pasean le soir même, ma jolie fermière voulait se placer dans une voiture à quatre places dans laquelle était monté son mari, ainsi que sa sœur, tandis que j’étais seul dans une jolie calèche à deux roues. Je fis du bruit ; je me récriai sur cette marque de défiance, et la compagnie lui remontra qu’elle ne pouvait pas me faire cet affront. Elle vint, et ayant dit au postillon que je voulais aller par le plus court, il se sépara des autres voitures, prenant le chemin du bois de Cequini. Le ciel était beau quand nous partîmes, mais en moins d’une demi-heure il s’éleva un orage de l’espèce de ceux qu’on voit fréquemment dans le Midi, qui ont l’air de vouloir bouleverser la terre et les éléments, et qui finissent en rien, le ciel redevenant serein, l’air étant rafraîchi ; de sorte qu’ils font beaucoup plus de bien que de mal.

« Ah ! ciel ! s’écria ma fermière, nous allons essuyer un orage.

- Ouis, luis dis-je, et quoique la calèche soit couverte, la pluie abîmera votre bel habit ; j’en suis fâché.

- Patience quant à l’habit, mais je crains le tonnerre.

- Bouchez-vous les oreilles.

- Et la foudre ?

- Postillon, allons quelque part nous mettre à couvert.

- Il n’y a des maison, monsieur, qu’à une demi-lieue d’ici ; et avant que nous puissions les atteindre, l’orage sera passé. »

Il poursuit tranquillement son chemin, et voilà les éclairs qui se succèdent, la foudre qui gronde, et ma fermière qui tremble. La pluie commence à tomber à verses : j’ôte mon manteau pour nous couvrir par devant, et au même instant, éblouis par un éclair, nous voyons tomber la foudre à cent pas de nous. Les chevaux se cabrent et ma pauvre compagne est saisie de convulsions spasmodiques. Elle se jette sur moi, me serre étroitement. Je me baisse pour relever le manteau qui était tombé, et profitant de la circonstance, je la découvre. Elle fait un mouvement pour rabaisser sa robe, mais au même instant un nouveau coup de tonnerre éclate et lui ôte la force de se mouvoir. Cherchant à la couvrir de mon manteau, je l’attire à moi, et le mouvement de la voiture secondant ce mouvement, elle tombe sur moi dans la position la plus heureuse. Je ne perds pas de temps, et faisant semblant d’arranger ma montre dans mon gousset, je me prépare à l’assaut. De son coté, sentant que, si elle ne m’empêchait pas bien vite, il ne lui resterait aucun moyen de m’échapper, elle fait un effort ; mais, la retenant, je luis dis que, si elle ne faisait pas semblant d’être évanouie, le postillon verrait tout en se tournant ; et lui laissant le plaisir de m’appeler impie, mauvais sujet et tout ce qu’elle voulut, je remportait la victoire la plus complète qu’athlète ait jamais remportée.

La pluie continuait à tomber par torrents, le vent qui était très-fort nous venait en face, et réduite à rester dans sa position, elle me dit que je la perdais d’honneur, puisque le postillon pouvait tout voir.

« Je le vois, lui répondis-je, il ne pense pas à se retourner ; et quand bien même, le manteau nous met à l’abri de ses regards : soyez sage et tenez-vous comme évanouie, car je ne vous lâche point. »

Elle semble se résigner et me demande comment je pouvais défier la foudre.

« Elle est d’accord avec moi, lui dis-je. » Et presque tentée de croire que je dis vrai, sa frayeur s’évanouit et, sentant mon extase, me demande si j’ai fini. Je souris et lui dis que non, puisque je voulais son consentement jusqu’à la fin de l’orage.

« Consentez, ou je laisse tomber le manteau.

- Homme affreux qui m’avez rendue malheureuse pour le reste de mes jours, êtes-vous content, à présent ?

- Non.

- Que voulez-vous encore ?

- Un déluge de baisers.

- Que je suis malheureuse ! Eh bien ! tenez.

- Dites que vous me pardonnez, et convenez que vous avez partagé mes plaisirs.

- Vous le savez bien : oui, je vous pardonne. »

Alors, lui rendant la liberté et usant à son égard de certaines complaisances, je la priai d’en avoir pour moi de pareilles ; ce qu’elle fit avec le sourire sur les lèvres.

« Dites-moi que vous m’aimez, lui dis-je.

- Non, car vous êtes un athée et l’enfer vous attend. »

Le beau temps étant revenu et l’ordre rétabli, je lui dis en lui baisant les mains qu’elle pouvait être sûre que le postillon n’avait rien vu, et que j’était certain de l’avoir guérie de la peur du tonnerre, et qu’elle ne révélerait à personne le secret qui avait opéré sa guérison. Elle me répondit que pour le moins elle était bien sûre que jamais femme n’avait été guérie par un pareil remède.

« Cela, repris-je, doit être arrivé en mille ans un million de fois. Je vous dirai même que j’y ai compté en montant dabs la calèche, car je ne voyais pas d’autre moyen de parvenir à vous posséder. Consolez-vous, et croyez qu’il n’y a pas de femme peureuse qui, dans votre cas, eût pu résister.

- Je le crois, mais à l’avenir je ne voyagerai plus qu’avec mon mari.

- Vous ferez mal, car votre mari n’aurait pas eu l’esprit de vous consoler comme je l’ai fait.

- C’est encore vrai. On gagne avec vous de singulières connaissances : mais nous ne voyagerons plus tête à tête. »

Tout en causant de la sorte, nous arrivâmes à Pasean une heure avant les autres. Nous descendîmes, et ma belle courut s’enfermer dans sa chambre, tandis que je cherchais dans ma
bourse un écu pour le postillon. Je vis qu’il riait.

« De quoi ris-tu ? lui dis-je.

- Vous le savez bien.

- Tiens, voilà un ducat, et surtout sois discret. »


Chap. V