sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Epigramas, de Marcial



                        I, 24

Invitas nullum nisi cum quo, Cotta, lavaris
Et dant convivam balnea sola tibi.
Mirabar, quare numquam me, Cotta, vocasses:
Iam scio, me nudum displicuisse tibi.

Não convidas ninguém, Cota, senão os que contigo se banham,
escolhes os teus convivas dentro dos balneários.
Espantava-me eu, ó Cota, que nunca a mim me convidasses.
Já percebi: quando nu, não sou do teu agrado!

                        I,25

Aspicis incomptis illum, Deciane, capillis,
Cuius et ipse times triste supercilium,
Qui loquitur Curios adsertoresque Camillos?
Nolito fronti credere: nupsit heri.


Estás a ver, Deciano, aquele tipo de cabelos desgrenhados,
de que tu próprio temes o cenho carregado,
que só fala dos Cúrios e dos Camilos, esses heróis de outrora?
Não te fies no seu aspecto: ainda ontem fez de noiva!

                        I,35

Incustoditis et apertis, Lesbia, semper
Liminibus peccas nec tua furta tegis,
Et plus spectator quam te delectat adulter
Nec sunt grata tibi gaudia si qua latent.
At meretrix abigit testem veloque seraque
Raraque Submemmi fornice rima patet.
A Chione saltem vel ab Iade disce pudorem:
Abscondunt spurcas et monumenta lupas.
Numquid dura tibi nimium censura videtur?
Deprendi veto te, Lesbia, non futui.

Sem guarda à porta, com os batentes escancarados, ó Lésbia,
é que te apraz fazer amor, acto que nunca escondes.
Dá-te mais gozo um espectador do que um amante,
e não te dão prazer os prazeres que se ocultam.
Até a meretriz se esconde, corre a cortina e fecha a porta,
e nem por uma greta se vislumbra o interior do prostibulo.
Aprende a ter pudor ao menos com Quíone ou com Íade:
até um túmulo serve para esconder tão reles putas.
Acaso te parece excessiva a minha censura, Lésbia?
Acho bem que forniques, em público é que não!

                         I,36

 Versus scribere me parum severos
 Nec quos praelegat in schola magister,
 Corneli, quereris: sed hi libelli,
 Tamquam coniugibus suis mariti,
 Non possunt sine mentula placere.
 Quid si me iubeas talassionem
 Verbis dicere non talassionis?
 Quis Floralia vestit et stolatum
 Permittit meretricibus pudorem?
 Lex haec carminibus data est iocosis,
 Ne possint, nisi pruriant, iuvare.
 Quare deposita severitate
 Parcas lusibus et iocis rogamus,
 Nec castrare velis meos libellos.
 Gallo turpius est nihil Priapo.


Que sejam os meus versos pouco sérios,
tais que o mestre os não pode ler na escola,
tu lamentas, Cornélio. Porém, os meus livrinhos,
tal como as suas consortes os maridos,
não podem sem caralho dar prazer.
Como escrever lascivo canto nupcial
sem usar lascivos termos nupciais?
Quem com traje de jogos florais, as meretrizes
permite que tenham seriedade de matronas?
Estes ligeiros poemas a uma lei obedecem:
apenas dão prazer se forem excitantes.
Por isso dá ao demo a seriedade,
não condenes, te peço, as minhas brincadeiras,
e tira da ideia castrar os meus livrinhos.

Nada há mais torpe que um Príapo capado! 

Tradução de José António Campos em 
Antologia de poesia latina, erótica e satírica, por um grupo de docentes da Faculdade de Letras de Lisboa. Fernando Ribeiro de Mello – Edições Afrodite, Lisboa, 1975

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