segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Epigramas, de Marcial



                                    I, 97

Si non molestum est teque non piget, scazon,
Nostro rogamus pauca verba Materno
Dicas in aurem sic ut audiat solus.
Amator ille tristium lacernarum
Et baeticatus atque leucophaeatus,
Qui coccinatos non putat viros esse
Amethystinasque mulierum vocat vestes,
Nativa laudet, habeat et licet semper
Fuscos colores, galbinos habet mores.
Rogabit, unde suspicer virum mollem.
Una lavamur: aspicit nihil sursum,
Sed spectat oculis devorantibus draucos
Nec otiosis mentulas videt labris.
Quaeris quis hic sit? Excidit mihi nomen. 



Se a coisa te não maça ou enfastia, escazonte (*),
eu te peço, ao meu caro Materno estas breves palavras
diz ao ouvido, de modo que apenas ele as oiça.
Aquele apreciador de capotes sombrios,
que se veste de lã e de trajes cinzentos,
que chama aos que usam roupas vermelhas maricas
e acha os tecidos cor de ametista próprios de mulheres,
por mais que gabe as vestes simples, e sempre use
sombrias cores, é esverdeado nos costumes.
Por que o julgo invertido?, perguntarás tu.
Tomamos banho juntos: nunca olha para cima,
mas com olhos vorazes contempla os paneleiros
e cresce-lhe a água na boca ao ver caralhos.
Queres saber quem é ele? Já me escapou seu nome (**)

(*) Escazonte é o tipo de verso em que está escrito este epigrama. O poeta dirige a palavra, portanto, ao próprio poema.
(**) Esta expressão tem duplo sentido. O poeta pode querer dizer 1— já esqueci o seu nome; ou 2 — lá deixei escapar o seu nome, oculto em qualquer vocábulo usado no poema. A tentativa de reconstituição desse nome, alias duvidosa, só poderá, naturalmente, fazer-se em presença do texto latino.


                            II, 4


O quam blandus es, Ammiane, matri!
Quam blanda est tibi mater, Ammiane!
Fratrem te vocat et soror vocatur.
Cur vos nomina nequiora tangunt?
Quare non iuvat hoc quod estis esse?
Lusum creditis hoc iocumque? Non est:
Matrem, quae cupit esse se sororem,
Nec matrem iuvat esse nec sororem. 



Ó Amiano, como és terno para a tua mãe,
e como é terna para ti a tua mãe, Amiano!
Ela chama-te “irmão”, e tu chamas-lhe “irmã
Por que razão vos excitam esses nomes ambíguos?
Por que não ser apenas o que de facto sois?
Achas que isso não passa de brincadeira? Engano.
Quando uma mãe pretende ser tida por irmã,
é porque não quer ser nem irmã nem mãe!


                              II, 62
Quod pectus, quod crura tibi, quod bracchia vellis,
Quod cincta est brevibus mentula tonsa pilis:
Hoc praestas, Labiene, tuae - quis nescit? - amicae.
Cui praestas, culum quod, Labiene, pilas?


Tu depilas o peito, as pernas e os braços,
à volta do caralho cortas o pêlo curto,
Para agradar, Labieno (quem o ignora?), à tua amante.
Mas a quem queres tu agradar, Labieno, ao depilar o cu?

                               III, 51

Cum faciem laudo, cum miror crura manusque,
Dicere, Galla, soles 'Nuda placebo magis,'
Et semper vitas communia balnea nobis.
Numquid, Galla, times, ne tibi non placeam?


Quando gabo teu rosto, quando exalto tuas pernas, tuas mãos,
dizes-me sempre, Gala: Toda nua, ainda mais te agradarei!
Recusas-te, porém, a banhar-te comigo.
Recearás tu, Gala, que eu não seja do teu agrado?

                                
                              III, 53

Et voltu poteram tuo carere
Et collo manibusque cruribusque
Et mammis natibusque clunibusque,
Et, ne singula persequi laborem,
Tota te poteram, Chloe, carere 


Não me faz falta teu rosto,
nem teu colo, mãos ou pernas,
nem mamas, nalgas ou cu.
Não irei dar-me ao trabalho
de citar tudo, Cloé:
não me fazes falta tu!




Tradução de José António Campos em 
Antologia de poesia latina, erótica e satírica, por um grupo de docentes da Faculdade de Letras de Lisboa. Fernando Ribeiro de Mello – Edições Afrodite, Lisboa, 1975

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