sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Epigramas, de Marcial


                                  III,68

Huc est usque tibi scriptus, matrona, libellus.
Cui sint scripta, rogas, interiora? mihi.
Gymnasium, thermae, stadium est hac parte: recede.
Exuimur: nudos parce videre viros.
Hinc iam deposito post vina rosasque pudore,
Quid dicat, nescit saucia Terpsichore:
Schemate nec dubio, sed aperte nominat illam,
Quam recipit sexto mense superba Venus,
Custodem medio statuit quam vilicus horto,
Opposita spectat quam proba virgo manu.
Si bene te novi, longum iam lassa libellum
Ponebas, totum nunc studiosa leges. 


Até aqui, digna matrona, foi escrito para ti este livrinho.
— “E os poemas seguintes, para quem os escreveste?” — Para mim!
Deste lado encontram-se o ginásio, as termas, o estádio.  Afasta-te!
Vamos despir-nos. Não queiras ver homens nus.
Desde agora, sem qualquer pudor — já veio o vinho e as rosas!—
a ébria Terpsicore já nem sabe o que diz.
Sem metáforas, abertamente falará “daquela coisa”
que no mês de Agosto Vénus acolhe dentro de si,
“aquilo” que o hortelão põe de guarda ao pomar (*),
e que casta donzela não vê sem logo o rosto cobrir.
Se bem te conheço, tu que já te cansavas dum livro tão grande
e ias pô-lo de lado, irás agora pressurosa lê-lo ate ao fim!

(*) Príapo, ou melhor, o seu célebre e descomunal atributo!

III, 80
De nullo loqueris, nulli maledicis, Apici:
Rumor ait linguae te tamen esse malae.


De ninguém te queixas, Apício, nem maldizes ninguém,
mas corre o boato de que tens cá uma língua!...

III, 81
Quid cum femineo tibi, Baetice Galle, barathro?
Haec debet medios lambere lingua viros.
Abscisa est quare Samia tibi mentula testa,
Si tibi tam gratus, Baetice, cunnus erat?
Castrandum caput est: nam sis licet inguine Gallus,
Sacra tamen Cybeles decipis: ore vir es. 

Bético eunuco, que te interessam as profundezas femininas?
Tua língua só devia servir para lamber pichas!
Por que cortaste o caralho com um caco de Samos,
Bético, se afinal tanto gostavas de cona?
Tens de castrar a cabeça, pois se nas virilhas és eunuco,
enganas mesmo assim Cibele: és viril pela boca!

IV, 43
Non dixi, Coracine, te cinaedum:
Non sum tam temerarius nec audax
Nec mendacia qui loquar libenter.
Si dixi, Coracine, te cinaedum,
Iratam mihi Pontiae lagonam,
Iratum calicem mihi Metili:
Iuro per Syrios tibi tumores,
Iuro per Berecyntios furores.
Quid dixi tamen? Hoc leve et pusillum,
Quod notum est, quod et ipse non negabis
,Dixi te, Coracine, cunnilingum. 

Nunca disse, ó Coracino, que tu fosses panasca:
não sou tão temerário ou descarado
que me ponha a mentir sem mais aquelas!
Se eu disse, ó Coracino, que tu eras panasca,
que me destrua o frasco de veneno de Pôntia,
que me destrua o cálice de veneno de Metílio.
Juro-te pelos inchaços sírios,
juro-te pelos furores berecíntios! (* )
O que eu de facto disse, é coisa sem importância,
de todos conhecida, que nem tu mesmo negarás:
só disse que és, Coracino, um lambe-conas!

(*) Alusão ao culto asiático de Cibele, e aos seus sacerdotes eunucos.


IV, 85
Non est in populo nec urbe tota,
A se Thaida qui probet fututam,
Cum multi cupiant rogentque multi.
Tam casta est, rogo, Thais? Immo fellat. 

Nenhum homem, de todos os que em Roma habitam,
poderá garantir que Tais já fodeu.
E muitos são os que a desejam e requestam.
“Quê? Tão casta é Tais?” — Não, ela só brocha!

VII, 30
Das Parthis, das Germanis, das, Caelia, Dacis,
Nec Cilicum spernis Cappadocumque toros;
Et tibi de Pharia Memphiticus urbe fututor
Navigat, a rubris et niger Indus aquis;
Nec recutitorum fugis inguina Iudaeorum,
Nec te Sarmatico transit Alanus equo.
Qua ratione facis, cum sis Romana puella.
Quod Romana tibi mentula nulla placet?

Entregas-te, ó Célia, a Partos, a Germanos, a Dácios
e não desdenhas deitar-te com Cílices ou Capadócios;
para te foder navegam Egípcios de Faros,
e vêm do mar Vermelho negros Indianos;
não te negas ao órgão circunciso dos Judeus
e o Alano em seu cavalo sármata não passa por ti em vão.
Mas, sendo tu Romana, por que bulas
é que nunca te agrada um caralho romano?!



Tradução de José António Campos em 
Antologia de poesia latina, erótica e satírica, por um grupo de docentes da Faculdade de Letras de Lisboa. Fernando Ribeiro de Mello – Edições Afrodite, Lisboa, 1975

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